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Como pequenas livrarias sobrevivem à revolução digital

Quem passa pela fachada da livraria Novesete, localizada no bairro da Vila Mariana, na Zona Sul da capital paulista, pode não imaginar que dentro do sobrado de paredes laranja se encontra um ambiente mágico.

O estabelecimento é especializado em literatura infantojuvenil. São 15 mil títulos. A loja também vende quebra-cabeças de ilustradores infantis.

Mas o que chama mesmo a atenção dos pequenos é a agenda de eventos gratuitos que a NoveSete oferece aos sábados. São rodas de contadores de história, shows musicais, jogos e brincadeiras inspiradas em livros, tarde de autógrafos com autores e diversas oficinas, como de origami, cupcake e stencil art.

A Novesete também conta com um salão de exposições de 100 metros quadrados, localizado na parte de trás do estabelecimento. Ano passado houve uma amostra de Andre Neves, escritor ganhador do Prêmio Jabuti 2017 na categoria ilustração de livro infantil. A curadoria de conteúdo faz parte do posicionamento da Novesete de formar leitores.

“Para tomar gosto pela leitura, as crianças precisam frequentar livrarias e bibliotecas, conhecer autores, descobrir seus interesses e fazer suas próprias escolhas literárias”, afirma Gisele Gambini, fundadora da livraria.

LIVRARIA NOVESETE: EVENTOS LEVAM MAIS PÚBLICO PARA A LOJA

Realizar eventos também é uma maneira de levar mais público para o ponto de venda – e consequentemente aumentar as receitas.

Do ponto de vista do marketing, a atuação num nicho de mercado e o investimento em conteúdo são maneiras de uma pequena loja se diferenciar frente às grandes redes concorrentes, como Livraria Cultura e a Saraiva.

Fundada em 2007 e registrada no Simples Nacional, com faturamento anual de até R$ 3,6 milhões no ano passado, a Novesete é uma sobrevivente.

De acordo com um levantamento da consultoria Cognatis Big Data Geomarketing, o número de livrarias na capital paulista recuou 33% em uma década. Hoje, são cerca 1630 estabelecimentos ativos na cidade.

“As pequenas livrarias estão fechando as portas”, afirma Alexandre Martins Fontes, sócio da editora e das livrarias homônimas. “O mercado livreiro está nas mãos de poucas empresas, reflexo deste momento difícil do mercado.”

Durante a recessão, o faturamento do setor registrou queda brusca. Foi de 7% em 2015 e 9% em 2016. Ano passado, houve um respiro positivo. O mercado de livros cresceu 3% em receitas e registrou a primeira alta em quatro anos, desde que a Nielsen passou a elaborar o levantamento.

O resultado foi divulgado pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros e contempla as vendas em livrarias, supermercados e bancas de jornais.

“Não percebemos nenhum fato novo relevante exclusivo das livrarias”, afirma Flavio Seibel, diretor da Livraria da Vila. “Acredito que o resultado positivo tem a ver com a própria recuperação econômica do país, que teve início no segundo semestre de 2017.”

Prestes a completar 33 anos, a Livraria da Vila é uma das redes mais tradicionais de São Paulo. São seis unidades na cidade.

Numa época em que o ponto de venda se torna um local de experiência, Seibel afirma que a busca por diferenciação passa pelo investimento em atendimento, exposição de produtos e arquitetura de loja.

A diversificação de produtos também é uma demanda dos novos tempos. Cerca de 20% das receitas da Livraria da Vila são provenientes de venda de DVDs, games, jogos de tabuleiro, entre outros produtos.

“Acreditamos, porém, que o principal foco de uma livraria deve ser a venda de livros”, afirma Seibel.

INTERIOR DA UNIDADE DA VILA MADALENA DA LIVRARIA DA VILA: ATENDIMENTO, ARQUITETURA E DISPOSIÇÃO DE PRODUTOS COMO DIFERENCIAÇÃO

IMPACTOS

Há diferentes fatores capazes de explicar essa redução expressiva do setor. Para começar, é preciso citar o fator conveniência proporcionado pela revolução digital.

Em 2014, a Amazon, maior loja online do mundo, passou a vender livros físicos no Brasil, acirrando a concorrência nos e-commerces. De acordo com o E-Bit, a categoria livros/assinaturas/apostilhas foi responsável por 12,2% dos pedidos realizados na internet em 2016.

“Ao lado de papelarias, lojas de eletrônicos e de bebidas, as livrarias estão entre os segmentos impactados negativamente pelo crescimento das vendas eletrônicas”, afirma Reinaldo Gregori, sócio-fundador da Cognatis.

Em julho do ano passado, a Livraria Cultura, fundada há 70 anos e ainda sob controle da família Herz, anunciou a aquisição da operação brasileira da Fnac, com 12 lojas e um site. A rede de origem francesa, além de livros, oferece uma ampla gama de aparelhos eletrônicos e games.

A compra deve favorecer a estratégia de diversificação de receitas da Livraria Cultura, apoiada por grandes estabelecimentos culturais, com direito até a palco de espetáculo (e altos custos), que se proliferou como lojas âncoras em centros comerciais nos últimos anos.

Já em dezembro, a Livraria Cultura anunciou outra aquisição. Dessa vez foi a da Estante Virtual, marketplace especializado na venda de livros de sebos, que reúne 3,6 milhões de leitores cadastrados.

As movimentações das grandes empresas levam a crer que o futuro do negócio deverá ser baseado em marketplaces, que é uma das tendências do e-commerce, capitaneada por grandes lojas online que também vendem livros, como Submarino e Casas Bahia.

Já para as pequenas, o caminho pode ser continuar correndo pelas beiradas e focar em segmentação de público-alvo, como a Gibiteria, livraria especializada na venda de quadrinhos, localizada na Praça Benedito Calixto.

Outra possibilidade é apostar na criação de ambientes intimistas, como a Livraria Zacarra, que funciona num pequeno imóvel em Perdizes e oferece uma série de eventos e uma lanchonete com bolos feitos pela própria fundadora.

IMAGEM: Adriana Valentim/Divulgação

Fonte: Diário do Comércio

Sobre o autor

Wagner Marcelo

Atua profissionalmente como arquiteto de inovação, gerando e fomentando ecossistemas empreendedores e tecnológicos, tendo como missão o desenvolvimento de negócios disruptivos.

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