Cultura empreendedora Editorial

SPAC, a nova modalidade de investimento

Conceito inverte a lógica dos IPOs e primeiro faz a listagem de uma empresa sem ativos na Bolsa para depois identificar candidatos para serem adquiridos como empresa de capital aberto.

Vez ou outra, as startups trazem novidades que movimentam o mercado e direcionam o olhar dos investidores para novas possibilidades. O ano de 2020 trouxe destaque a um novo modelo de investimento, chamado de SPAC, que na tradução para o português, a sigla ganha o significado de companhia com propósito especial de aquisição.

Um formato que muda totalmente a lógica de investimento. Primeiro os investidores levantam o dinheiro, fazem a listagem de uma empresa sem ativos na bolsa e depois correm atrás de candidatos para serem adquiridos e, assim, ocuparem o posto de empresa de capital aberto.

Apesar de sugerir algum tipo de semelhança com fundos de private equity, trata-se de um conceito com formas de captação de recursos e de atuação bem diferentes – com poucas obrigações e muitos riscos.

Ainda uma novidade no Brasil, o conceito já é uma realidade nos Estado Unidos. Em 2020, foram registrados mais de 240 IPOs de SPACs, de acordo com dados da SpacInsider. E no primeiro semestre deste ano, mais de 300 operações já foram confirmadas.

Em terras brasileiras, por enquanto, órgãos como a ANBIMA e a B3 e outras entidades do Mercado de Capitais discutem a “tropicalização” das SPACs, que ainda deverá percorrer um longo caminho entre legislação, regulação, tributação, dentre outros aspectos legais e econômicos.

Por outro lado, já existem executivos e gestoras do Brasil criando SPACs nos Estados Unidos, de olho em adquirir uma empresa de tecnologia ou varejo com potencial de crescimento por aqui ou na América Latina.

De acordo com Helder Fonseca, sócio-advogado e especialista em direito corporativo, societário do GVM Advogados, essas empresas são conhecidas como veículo de investimentos e possuem previsão legal e regulatória na jurisdição americana.

O especialista explica que o modelo foi criado por uma gestora de investimentos de renome e especializada neste tipo de veículo, com o intuito de captarem investidores no mercado, via processo semelhante ao tradicional IPO e em bolsa de valores, com a oportunidade de se tornarem acionistas, mas sem toda a complexidade e burocracia de um IPO tradicional.

“A SPAC funciona, de um lado, como uma alternativa de investimentos aos investidores e, de outro lado, como uma oportunidade para as empresas alvo acessarem o mercado de capitais sem percorrer todo o longo caminho de um IPO”.

Fonseca lista algumas razões para o termo ter ganho destaque nos últimos dois anos:

– Maior liquidez nos mercados mundo afora, que aumenta a disposição dos investidores a investimentos de maior risco e em outras jurisdições;

-Disrupção tecnológica trazida não somente pela evolução natural das Techs Companies, mas, em maior escala, durante a pandemia, já que os negócios foram obrigados a se reinventar em seus processos, produtos e serviços;

– Taxa de juros estabilizada ou até mesmo decrescente. Isso força o investidor a buscar outras alternativas para aplicar recursos;

– Surgimento de várias empresas do setor de tecnologia fazendo disrupção de modelos de negócios e precisando conquistar recursos em volume considerável e de forma rápida;

– Maior integração dos mercados financeiros consolidados e os mercados emergentes, o que facilita a transferência de recursos de uma localidade para a outra.

Ainda deixando um rastro de perguntas sobre o seu impacto, um dos diferenciais do modelo é justamente a confiança que os acionistas depositam nos gestores – mesmo sem uma operação exata, produto, vendas ou resultado.

COMO FUNCIONA NA PRÁTICA

1. Ao criar a SPAC, registrada como uma empresa de capital aberto na SEC (Securities and Exchange Commission, o órgão que regulamenta os mercados de capitais dos Estados Unidos), seus gestores determinam o valor que desejam captar, mas não têm obrigação de revelar o setor de atuação e a localização geográfica do negócio a ser adquirido.

2. Começa a busca no mercado para angariar o valor pretendido. Por isso, é importante que os gestores tenham credibilidade no mercado para atrair investidores, pois o que estão vendendo neste momento pré-aquisição é justamente a sua imagem no mercado.

3. Com o montante disponível, há um prazo de até dois anos para achar a empresa que será o veículo da aquisição da SPAC. Ao encontrá-la e obter o aval dos investidores, acontece um processo clássico de M&A (fusão e aquisição) e o negócio adquirido passa a ser negociado na Bolsa no lugar da ação original da SPAC.

4. Os investidores tornam-se, então, acionistas da empresa adquirida e os gestores passam a controlar cerca de 20%.

Um cuidado: neste momento tudo pode dar errado se os investidores não concordarem com a escolha da empresa a ser adquirida. Neste caso, eles podem retirar o capital investido e caso os gestores não encontrem uma empresa para comprar no período de dois anos, os investidores também recebem o dinheiro de volta — com acréscimo de juros e desconto das taxas administrativas.

Vantagens: criadas para reunir recursos financeiros de forma rápida e menos burocrática, sem as exigências de um IPO, como demonstrações financeiras, levantamento de investidores e contratação de assessor financeiro. Também dão maior segurança aos investidores que querem ingressar na Bolsa sem sofrer a volatilidade do mercado de capitais.

Surgimento: Os primeiros relatos e materiais sobre o assunto sugerem que o modelo exista desde a década de 1980, mas sofreu modificações e na configuração atual é utilizado desde o início dos anos 2000. Diferente do Brasil, no mercado americano o produto é regulamentado depois de ter sido praticado, por isso a operação começa a valer antes de haver regulação.

Virou moda: Um dos motivos para o termo ter se tornado assunto no mercado é o envolvimento de agentes renomados do ecossistema neste tipo de operação. Steve Wozniak, cofundador da Apple, celebridades como o rapper Jay-Z, a tenista Serena Williams e o ex-jogador de basquete Shaquille O’Neal são alguns dos nomes relacionados ao modelo.

Nomes: Entre as empresas que se uniram a SPACs para abrir seu IPO estão o Burger King e a Virgin Galactic. Startups também estão aproveitando esse modelo para uma oferta pública inicial na Bolsa, entre elas a Plus, startup norte-americana de caminhões autônomos e a Grab, startup mais valiosa do Sudeste Asiático.

Riscos: Da perspectiva do investidor, os principais riscos seriam a SPAC estar nas mãos de um mau gestor e ocorrer uma demora ou inviabilidade para que o propósito de aquisição se conclua.

Como é vista no mercado: Alguns especialistas apontam que muitos SPACs não rendem como o esperado, por isso é preciso uma visão crítica. É possível que por meio desse modelo, muitas empresas cheguem à Bolsa sem estar maduras o suficiente no mercado.

Fonte: Diário do Comércio

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Sobre o autor

Wagner Marcelo

Atua profissionalmente como arquiteto de inovação, gerando e fomentando ecossistemas empreendedores e tecnológicos, tendo como missão o desenvolvimento de negócios disruptivos.

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